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A Reforma Tributária traz uma mudança estrutural na forma como empresas calculam e repassam impostos: a substituição de PIS, COFINS, ICMS e ISS pelo IVA Dual, composto por CBS (federal) e IBS (estadual e municipal). A partir de 2026, o sistema de não-cumulatividade ampla e crédito integral exigirá revisão completa de políticas de precificação, gestão de custos e estratégias comerciais.
Este guia apresenta os fundamentos da formação de preço no novo modelo tributário, exemplos práticos de cálculo, estratégias para proteger margem e evitar perda de competitividade, e um roteiro de implementação para sua empresa estar preparada antes da transição.
O que é o IVA Dual e como ele funciona
O IVA Dual é um imposto sobre valor agregado dividido em duas contribuições: a CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços), de competência federal, e o IBS (Imposto sobre Bens e Serviços), de competência estadual e municipal. Ambos funcionam com o mesmo princípio de não-cumulatividade plena: cada etapa da cadeia produtiva gera crédito sobre o imposto pago nas operações anteriores, que pode ser abatido do débito gerado nas vendas.
Na prática, isso significa que uma empresa que compra insumos por R$ 10.000 e paga R$ 2.600 de IVA embutido pode apropriar esse valor como crédito. Quando vende o produto final por R$ 20.000 e gera um débito de R$ 5.200, recolhe apenas a diferença: R$ 2.600. O imposto incide apenas sobre o valor que a empresa agregou na operação.
Esse mecanismo elimina a tributação em cascata, reduz distorções competitivas e torna o sistema mais transparente. Mas também exige controle rigoroso de documentação fiscal, rastreamento de créditos e revisão constante da estrutura de custos. Para entender o contexto completo da Reforma Tributária, veja nosso guia sobre IBS e CBS.
Por que a precificação precisa ser repensada
No sistema atual, empresas convivem com múltiplas alíquotas, regimes diferenciados por setor, exceções estaduais e uma lógica parcialmente cumulativa. A formação de preço se apoia em percentuais fixos de impostos embutidos, ajustados periodicamente conforme mudanças legislativas.
Com o IVA Dual, o raciocínio muda: o que importa não é mais a alíquota nominal, mas o imposto líquido, que resulta da diferença entre débito e crédito. Duas empresas no mesmo setor podem ter custos tributários muito diferentes dependendo de quanto crédito conseguem gerar. Quem compra insumos com documentação adequada e aproveita todos os créditos disponíveis terá vantagem competitiva direta sobre quem não o faz.
Além disso, o IVA Dual incentiva a formalização da cadeia: empresas que antes operavam com fornecedores informais ou sem nota fiscal perderão créditos tributários valiosos. A formação de preço passa a ser um exercício de engenharia tributária, não apenas de markup sobre custos.
Componentes da nova formação de preço
A estrutura básica de precificação no IVA Dual pode ser resumida em cinco pilares:
Custos diretos e variáveis: matérias-primas, mercadorias para revenda, insumos, embalagens, fretes e serviços terceirizados diretamente vinculados ao produto ou serviço. Todos esses itens, quando adquiridos com nota fiscal que destaca IVA, geram crédito tributário.
Custos fixos e despesas operacionais: aluguel, folha de pagamento, energia, telecomunicações, marketing, seguros e depreciação. Alguns desses itens podem gerar crédito (como energia e serviços de marketing contratados), outros não (como salários). A análise item a item é essencial.
Margem de contribuição: o valor que a empresa deseja obter por unidade vendida para cobrir custos fixos e gerar lucro. No IVA Dual, a margem precisa ser calculada após os tributos líquidos, não antes, para garantir rentabilidade real.
Débito de IVA: o imposto gerado pela venda, calculado pela aplicação da alíquota do IVA Dual sobre a base de cálculo da operação. Essa alíquota será definida nacionalmente e, no início, deve ficar em torno de 26% a 28%, mas pode variar conforme o setor e eventuais regimes diferenciados.
Crédito de IVA: o imposto recuperável sobre tudo que foi adquirido para viabilizar a operação. Esse é o componente mais estratégico: quanto maior o crédito, menor o imposto líquido e maior a competitividade.
Como calcular o preço passo a passo
O cálculo começa pela identificação dos custos reais e dos créditos disponíveis. Vamos supor que uma empresa presta serviços de consultoria e deseja definir o preço de um projeto.
Passo 1: Levante os custos diretos do projeto. Por exemplo: R$ 8.000 em honorários de consultores terceirizados, R$ 1.500 em softwares e ferramentas, R$ 500 em deslocamentos.
Passo 2: Identifique quais custos geram crédito. Consultores terceirizados (com nota fiscal) e softwares geram crédito. Deslocamentos também, se forem documentados. Total de crédito potencial: R$ 10.000.
Passo 3: Calcule os custos fixos rateados. Considere que esse projeto ocupa 10% da capacidade mensal da empresa, e os custos fixos mensais são R$ 30.000. Rateio: R$ 3.000.
Passo 4: Defina a margem desejada. Suponha que a empresa queira 20% de margem líquida sobre o preço de venda.
Passo 5: Calcule o débito e o crédito de IVA. Se o preço de venda for R$ 20.000 e a alíquota do IVA Dual for 26%, o débito será R$ 5.200. O crédito será 26% sobre R$ 10.000, ou seja, R$ 2.600. O imposto líquido será R$ 2.600.
Passo 6: Monte a estrutura de preço. Preço de venda: R$ 20.000. Custos diretos: R$ 10.000. Custos fixos rateados: R$ 3.000. Imposto líquido: R$ 2.600. Margem líquida: R$ 4.400, ou 22% do preço de venda.
Esse processo precisa ser repetido para cada linha de produto ou serviço, ajustado conforme a realidade de cada operação.
Exemplo prático de indústria
Uma fábrica de móveis compra madeira, ferragens, tintas e embalagens por R$ 50.000. Paga energia e serviços de logística por R$ 10.000. Custos fixos mensais (aluguel, folha, depreciação) somam R$ 40.000. A empresa vende a produção do mês por R$ 150.000.
No modelo antigo, a empresa calcularia os impostos de forma aproximada com base em alíquotas médias e embutidas. No IVA Dual, o cálculo é direto:
Débito de IVA sobre a venda: 26% de R$ 150.000 = R$ 39.000.
Crédito de IVA sobre insumos e serviços: 26% de R$ 60.000 (madeira, ferragens, tintas, embalagens, energia e logística) = R$ 15.600.
Imposto líquido: R$ 39.000 - R$ 15.600 = R$ 23.400.
Margem bruta antes de impostos: R$ 150.000 - R$ 60.000 - R$ 40.000 = R$ 50.000.
Margem líquida após impostos: R$ 50.000 - R$ 23.400 = R$ 26.600.
Se a empresa não aproveitasse os créditos (por exemplo, por comprar insumos sem nota fiscal), o imposto seria R$ 39.000, e a margem líquida cairia para R$ 11.000. A diferença de R$ 15.600 mostra o impacto direto da gestão de créditos na rentabilidade.
Estratégias para manter margem e competitividade
A transição para o IVA Dual cria oportunidades e riscos. Empresas que se organizarem cedo terão vantagem; as que demorarem podem perder espaço de mercado. Algumas estratégias práticas:
Auditoria completa de fornecedores: substitua fornecedores informais ou que não emitem nota fiscal por parceiros formais. Negocie descontos que compensem o custo adicional, se necessário. O crédito tributário muitas vezes supera o desconto perdido.
Revisão de contratos de longo prazo: inclua cláusulas de reequilíbrio econômico vinculadas a mudanças tributárias. Contratos firmados antes da Reforma podem prever ajustes de preço para refletir o novo cenário.
Precificação dinâmica por linha de produto: produtos que geram mais crédito (porque usam insumos formais e bem documentados) podem ter preços mais competitivos. Produtos que dependem de mão de obra (que não gera crédito) precisam de ajuste maior.
Transparência com clientes B2B: destaque o valor do IVA na nota fiscal e explique que o cliente também pode se creditar. Isso reduz a resistência a aumentos de preço e transforma o imposto em um ponto de negociação, não de atrito.
Bundles e kits: combine produtos de alta e baixa geração de crédito para manter a margem média. Por exemplo, inclua serviços de instalação (baixo crédito) em pacotes com equipamentos (alto crédito).
Gestão de estoque e timing de compras: antecipe compras de insumos para gerar crédito antes do início do regime. Empresas que acumularem créditos poderão operar os primeiros meses com carga tributária reduzida.
Erros comuns que devem ser evitados
Ignorar créditos de despesas operacionais: muitas empresas focam apenas nos insumos diretos e esquecem que energia, telecomunicações, marketing, consultorias e até fretes geram crédito. A soma desses itens pode representar 10% a 15% dos custos totais.
Não documentar operações internas: transferências entre filiais, remessas para industrialização e consignações precisam estar perfeitamente documentadas. Erros na escrituração podem bloquear créditos legítimos.
Manter preços fixos sem revisão: o IVA Dual exige revisão trimestral ou semestral de preços com base na evolução real dos créditos. Empresas que mantêm tabelas estáticas podem ver margens evaporarem.
Comunicação inadequada com clientes: aumentos de preço sem explicação geram atrito. Empresas que educam clientes sobre o sistema de créditos e mostram transparência nos cálculos conseguem repassar custos com mais facilidade.
Subestimar o impacto administrativo: a gestão do IVA Dual exige sistemas integrados, equipe treinada e rotinas de conciliação mensal. Empresas que mantêm processos manuais enfrentarão erros e perda de créditos.
Ferramentas e processos para implementar agora
A preparação começa com três frentes simultâneas: tecnologia, pessoas e processos.
Tecnologia: sistemas de ERP precisam estar prontos para calcular débito e crédito por operação, gerar relatórios de margem líquida por produto e conciliar automaticamente as notas fiscais de entrada e saída. Plataformas como a Beorange já oferecem módulos específicos para gestão do IVA Dual. Evite erros na elaboração de relatórios gerenciais conferindo nosso artigo sobre 5 falhas em relatórios financeiros.
Pessoas: treine equipes de compras, vendas, fiscal e financeiro. Compras precisam entender que fornecedores informais geram custo oculto. Vendas precisam saber explicar a estrutura de preços. Fiscal precisa dominar as regras de crédito. Financeiro precisa acompanhar a margem real.
Processos: crie rotinas mensais de conciliação de créditos, revisão de margem por linha e simulação de cenários de preço. Empresas que esperam 2026 chegar para organizar esses processos perderão os primeiros meses de operação com retrabalho e correções.
Checklist de preparação para 2026
Para garantir que nada fique de fora, organize as ações em etapas:
Revise o cadastro de produtos e serviços no sistema fiscal para refletir a classificação do IVA Dual.
Mapeie todos os fornecedores e identifique quais precisam ser substituídos ou formalizados.
Audite contratos vigentes e negocie cláusulas de reequilíbrio tributário.
Simule a formação de preço de pelo menos 10 produtos ou serviços representativos usando a alíquota estimada do IVA Dual.
Configure relatórios gerenciais que mostrem débito, crédito e margem líquida por operação.
Treine as equipes comerciais para comunicar preços com transparência e confiança.
Estabeleça um comitê mensal de revisão de preços e margens.
Comparativo de lógica tributária
Aspecto | Sistema atual | IVA Dual (2026) |
|---|---|---|
Base de cálculo | Múltiplas, com exceções | Única e ampla |
Créditos | Limitados e parciais | Amplos e integrais |
Alíquotas | Variam por setor e estado | Nacionalmente uniformes |
Transparência | Impostos embutidos | Imposto destacado na nota |
Gestão | Foco em compliance | Foco em crédito e margem |
Competitividade | Dependente de benefícios | Dependente de formalização |
Essa mudança exige que empresas deixem de ver tributos como uma variável externa e passem a tratá-los como componente estratégico de formação de preço e gestão de custos.
Setores mais impactados
Alguns segmentos sentirão a mudança com mais intensidade:
Serviços: setores com alta proporção de mão de obra (que não gera crédito) precisarão revisar margens. Consultorias, escritórios e agências que terceirizam serviços terão vantagem sobre as que operam apenas com quadro próprio.
Comércio: distribuidores e varejistas que compram de atacadistas informais ou com margem muito apertada enfrentarão pressão. O crédito amplo favorece cadeias longas e bem documentadas.
Indústria: setores com muitos insumos e processos complexos (como alimentício, químico e metalúrgico) terão vantagem pelo volume de créditos. A gestão documental será crítica.
Tecnologia e SaaS: empresas que vendem software e serviços digitais terão crédito limitado (infraestrutura de nuvem, licenças, marketing digital), mas alíquota cheia na saída. Ajustes de preço serão inevitáveis.
Como a Beorange pode ajudar
A Beorange oferece uma plataforma integrada para gestão contábil, fiscal e financeira que já está preparada para a transição ao IVA Dual. Com a Beorange, a sua empresa reduz o risco de erro e acelera a adaptação ao novo regime.
Além disso, a equipe da Beorange apoia empresas na revisão de processos, treinamento de equipes e implementação de rotinas de gestão tributária que garantem aproveitamento máximo de créditos e competitividade sustentável.
Conclusão
A formação de preço no IVA Dual exige mudança de mentalidade: tributos deixam de ser um percentual fixo e passam a ser uma variável gerenciável. Empresas que dominarem a gestão de créditos, mantiverem fornecedores formais, treinarem equipes e revisarem preços periodicamente terão vantagem competitiva clara. As que ignorarem essas mudanças enfrentarão compressão de margem e perda de mercado.
O momento de se preparar é agora. Organize cadastros, revise contratos, simule cenários e capacite sua equipe. A transição para o IVA Dual é uma oportunidade de modernizar a gestão tributária e transformar impostos em alavanca estratégica de crescimento.
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