Beorange Blog
Search
Share
A Reforma Tributária brasileira está prestes a transformar radicalmente a forma como empresas calculam, recolhem e gerenciam impostos sobre consumo. A partir de 2026, inicia-se o período de transição que substituirá PIS, COFINS, ICMS, ISS e IPI pelo IVA Dual, composto por CBS (federal) e IBS (estadual e municipal). Essa mudança não é apenas legislativa: ela afeta preços, contratos, fluxo de caixa, sistemas de gestão e a estratégia competitiva de milhares de empresas.
Este guia explica, de forma objetiva e prática, o que são IBS e CBS, como funcionam, quem será afetado, qual o calendário de transição e quais ações concretas sua empresa precisa tomar agora para estar preparada e evitar riscos fiscais, financeiros e operacionais.
O que são IBS e CBS
O IVA Dual brasileiro divide o imposto sobre consumo em duas contribuições distintas, mas com mecânica integrada:
CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) é o tributo federal que substituirá PIS e COFINS. Será administrado pela Receita Federal e terá alíquota nacionalmente uniforme, aplicada sobre a base de cálculo ampla que inclui bens, serviços e direitos.
IBS (Imposto sobre Bens e Serviços) é o tributo subnacional que substituirá ICMS e ISS. Será administrado por um Comitê Gestor formado por estados e municípios, com arrecadação no destino e alíquota nacionalmente uniforme, mas repartição de receita entre os entes de acordo com a localização do consumidor final.
Ambos funcionam sob o princípio da não-cumulatividade plena: o imposto pago em uma etapa da cadeia gera crédito integral que pode ser abatido do imposto devido na etapa seguinte. Isso elimina o efeito cascata e reduz distorções competitivas causadas pela tributação sobre tributação. Para entender melhor toda a estrutura da Reforma Tributária, confira nosso guia completo.
Diferentemente do sistema atual, em que créditos são limitados a insumos diretamente vinculados à produção, o IVA Dual permite crédito amplo sobre quase todas as aquisições vinculadas à atividade econômica: desde matérias-primas e mercadorias até energia, telecomunicações, marketing, consultorias e investimentos em bens de capital.
Calendário de transição e como a mudança acontece
A transição não será abrupta. O legislador definiu um período de ajuste gradual que vai de 2026 a 2032, permitindo que empresas, governos e sistemas se adaptem progressivamente.
2026: ano de teste. A CBS começa a ser cobrada com alíquota reduzida (0,9%), e o IBS inicia com alíquota de 0,1%. PIS, COFINS, ICMS e ISS permanecem em vigor, mas com alíquotas ajustadas para compensar parcialmente a nova carga. Empresas começam a escriturar operações no novo formato e a gerar créditos, mas o impacto financeiro ainda é limitado.
2027 a 2032: período de convergência. A cada ano, as alíquotas de CBS e IBS sobem, e as de PIS, COFINS, ICMS e ISS caem proporcionalmente. Em 2033, o sistema antigo desaparece e o IVA Dual passa a operar plenamente, com alíquota padrão estimada entre 26% e 28% (somando CBS e IBS).
Esse cronograma dá tempo para que empresas ajustem sistemas, treinem equipes, revisem contratos e simulem cenários, mas exige início imediato de preparação. Empresas que esperarem 2027 ou 2028 para começar enfrentarão riscos de perda de créditos, inconsistências fiscais e pressão no fluxo de caixa.
Quem será afetado e como
Todas as empresas que vendem bens, serviços ou direitos no Brasil serão impactadas, mas a intensidade varia conforme o setor, o regime tributário e a estrutura de custos.
Empresas do Lucro Real e Lucro Presumido: serão diretamente atingidas. A substituição de PIS, COFINS, ICMS e ISS pelo IVA Dual exige revisão completa de políticas de precificação, cadastros fiscais, contratos de fornecimento e integração de sistemas. O crédito amplo pode reduzir a carga efetiva, mas só se a empresa tiver controle rigoroso de documentação e escrituração.
Empresas do Simples Nacional: embora o regime simplificado seja mantido, haverá interações com o IVA Dual. Empresas optantes pelo Simples que ultrapassarem o limite de faturamento (R$ 4,8 milhões em 2025) precisarão migrar para o regime de apuração do IVA Dual. Acompanhe sua situação no Portal do Simples Nacional. Além disso, fornecedores e clientes no regime geral poderão exigir notas fiscais que permitam crédito de IVA, pressionando pela formalização e migração.
Prestadores de serviços: setores intensivos em mão de obra (consultorias, escritórios de advocacia, agências, clínicas) enfrentarão desafios. Salários não geram crédito tributário, então a carga efetiva pode subir se a empresa não aumentar a terceirização de serviços ou a aquisição de insumos creditáveis (software, marketing, infraestrutura).
Comércio e indústria: setores com cadeias longas e muitos insumos tendem a se beneficiar do crédito amplo. Distribuidores, atacadistas e fabricantes que mantêm fornecedores formais e bem documentados poderão reduzir a carga tributária líquida. Já empresas que operam com fornecedores informais ou sem nota fiscal perderão créditos valiosos.
Startups e empresas de tecnologia: SaaS, plataformas digitais e empresas de tecnologia terão crédito limitado (infraestrutura de nuvem, licenças de software, marketing digital), mas alíquota cheia na saída. Ajustes de preço e revisão de modelos de negócio serão necessários.
Como funciona a mecânica de débito e crédito
A lógica do IVA Dual é simples no conceito, mas exige disciplina na execução. Cada operação gera dois movimentos simultâneos:
Débito: toda venda de bem, serviço ou direito gera um débito de CBS e IBS, calculado pela aplicação da alíquota sobre a base de cálculo da operação. Esse débito representa o imposto devido ao fisco pela operação de saída.
Crédito: toda aquisição de bem, serviço ou direito vinculada à atividade econômica gera um crédito de CBS e IBS, calculado pela aplicação da alíquota sobre o valor da operação de entrada. Esse crédito pode ser abatido do débito gerado nas vendas.
O imposto líquido a recolher é a diferença entre o débito total e o crédito total do período. Se o crédito for maior que o débito (situação comum em empresas em fase de investimento ou com muitas compras), o saldo credor pode ser ressarcido ou compensado com outros tributos federais, conforme regras a serem regulamentadas.
Exemplo prático: uma loja de eletrônicos compra produtos de um fornecedor por R$ 100.000 e paga R$ 26.000 de IVA embutido (26% de alíquota). Esse valor vira crédito. A loja vende os produtos por R$ 150.000 e gera um débito de R$ 39.000. O imposto a recolher é R$ 39.000 - R$ 26.000 = R$ 13.000. O imposto incide apenas sobre o valor agregado pela loja (R$ 50.000), não sobre o valor total da venda.
Essa mecânica exige conciliação rigorosa entre notas fiscais de entrada e saída, validação de documentos, classificação correta de operações e integração entre sistemas de compras, vendas e contabilidade.
Impactos diretos na gestão empresarial
A implementação do IVA Dual afeta praticamente todas as áreas da empresa:
Financeiro: o fluxo de caixa muda. Empresas que antes recolhiam tributos mensais com alíquotas fixas passarão a recolher valores variáveis que dependem do volume de créditos apropriados. Isso exige previsibilidade maior nas compras e controle de saldo de créditos.
Fiscal e contábil: a escrituração se torna mais complexa. Será necessário rastrear todas as operações de entrada e saída, validar notas fiscais, conciliar créditos e débitos e enviar declarações mensais detalhadas ao fisco. Erros de classificação ou falta de documentação podem resultar em perda de créditos ou autuações.
Comercial: contratos de fornecimento e venda precisam ser revisados. Cláusulas de reajuste de preço devem considerar a mudança tributária. Negociações com fornecedores e clientes passam a incluir discussões sobre crédito tributário e repasse de alíquotas.
Compras: a escolha de fornecedores deixa de ser apenas uma questão de preço e qualidade. Fornecedores que não emitem nota fiscal ou que operam na informalidade geram custo oculto pela perda de crédito tributário. Empresas precisarão formalizar cadeias de suprimento.
TI e sistemas: ERPs, sistemas de faturamento, emissores de nota fiscal e plataformas de conciliação precisam ser atualizados para calcular CBS e IBS, gerar relatórios de crédito e débito e integrar informações fiscais com contábeis e financeiras.
Estratégias de preparação imediata
A preparação para o IVA Dual não pode esperar 2026. Empresas que agirem agora terão vantagem competitiva e reduzirão riscos. As ações prioritárias incluem:
Diagnóstico fiscal completo: mapeie todos os tributos atualmente pagos, alíquotas aplicadas, regimes especiais, benefícios fiscais e créditos aproveitados. Compare com o cenário futuro do IVA Dual para identificar onde haverá aumento ou redução de carga.
Auditoria de fornecedores: levante todos os fornecedores de insumos, mercadorias, serviços e investimentos. Identifique quais operam na formalidade e emitem notas fiscais adequadas. Substitua ou formalize fornecedores informais para garantir crédito tributário.
Revisão de contratos: inclua cláusulas de reequilíbrio econômico vinculadas a mudanças tributárias. Contratos de longo prazo firmados antes da Reforma devem prever ajustes de preço para refletir a transição ao IVA Dual.
Simulação de cenários: calcule o impacto do IVA Dual em pelo menos três cenários: alíquota padrão (26%), alíquota reduzida para setores específicos (18%) e alíquota majorada (30%). Identifique produtos ou serviços que terão margem comprimida e ajuste preços preventivamente.
Atualização de sistemas: valide se seu ERP, sistema de faturamento e emissor de NFS-e estão prontos para calcular CBS e IBS, gerar relatórios de crédito e débito e enviar declarações no formato exigido pelo fisco. Empresas com sistemas legados precisarão investir em modernização.
Treinamento de equipes: capacite times de fiscal, contábil, financeiro, compras e vendas. Cada área precisa entender como o IVA Dual afeta suas rotinas e decisões. Falta de conhecimento gera erros e perda de competitividade.
Gestão de fluxo de caixa: ajuste projeções financeiras para considerar a mudança no timing de recolhimento de tributos. Empresas que acumularem créditos terão alívio temporário; as que tiverem débitos maiores precisarão de capital de giro adicional.
Erros que podem custar caro
A transição ao IVA Dual abre espaço para erros que podem resultar em autuações, perda de créditos e desvantagem competitiva. Os mais comuns:
Classificação incorreta de operações: confundir insumos que geram crédito com despesas que não geram pode distorcer cálculos e causar glosas fiscais. A legislação define critérios específicos de vinculação à atividade econômica que precisam ser observados.
Falta de documentação: notas fiscais sem destaque de IVA, notas de fornecedores inaptos ou operações sem documento fiscal não geram crédito. A exigência de rastreabilidade será rigorosa.
Não conciliar operações internas: transferências entre filiais, remessas para industrialização e devoluções precisam estar perfeitamente escrituradas. Inconsistências bloqueiam créditos legítimos.
Ignorar mudanças em contratos: manter contratos antigos sem cláusulas de ajuste tributário pode gerar prejuízo ou litígio. Revise todos os acordos de longo prazo e negocie aditivos.
Subestimar impacto em fornecedores pequenos: muitos fornecedores do Simples ou informais não estarão prontos para emitir notas com IVA destacado. Antecipe-se e apoie parceiros estratégicos na adequação.
Setores com desafios específicos
Alguns segmentos enfrentarão dificuldades maiores na transição:
Construção civil: ciclos longos de obra, múltiplos fornecedores, operações interestaduais e alta informalidade na cadeia exigem planejamento detalhado. A mudança no ICMS para IBS afeta diretamente a precificação e a margem.
Saúde: hospitais, clínicas e laboratórios têm alta proporção de custos com pessoal (que não gera crédito) e precisarão revisar estruturas de custo e preços de convênios e procedimentos.
Educação: instituições de ensino também dependem muito de mão de obra e terão crédito limitado. A alíquota efetiva pode subir, pressionando mensalidades.
Agronegócio: benefícios fiscais atuais (como crédito presumido de PIS/COFINS) serão revistos. Produtores e cooperativas precisarão simular cenários e negociar regimes diferenciados.
Varejo: margens apertadas e alta competitividade exigem gestão milimétrica de créditos. Varejistas que mantêm fornecedores informais ou que não aproveitam todos os créditos disponíveis perderão espaço.
Recursos e ferramentas de apoio
A complexidade do IVA Dual torna essencial o uso de tecnologia e assessoria especializada. Algumas ferramentas que farão diferença:
Sistemas de gestão integrada (ERP): plataformas já oferecem módulos específicos para cálculo automático de CBS e IBS, conciliação de créditos e débitos, geração de relatórios gerenciais e envio de declarações ao fisco.
Simuladores tributários: ferramentas que permitem testar diferentes cenários de alíquotas, volumes de compra e venda, e estruturas de custo para identificar o impacto real do IVA Dual na margem e no fluxo de caixa.
Consultorias especializadas: apoio de especialistas em Reforma Tributária para diagnóstico, simulação, revisão de contratos e implementação de processos.
Capacitação contínua: cursos, webinars e materiais educativos sobre IVA Dual, não-cumulatividade e gestão de créditos tributários.
Tabela de referência
Aspecto | Sistema atual | IVA Dual (2026 em diante) |
|---|---|---|
Tributos | PIS, COFINS, ICMS, ISS, IPI | CBS + IBS |
Lógica | Cumulativa ou não-cumulativa parcial | Não-cumulativa plena |
Créditos | Limitados a insumos e condições específicas | Amplos sobre quase todas as aquisições |
Alíquotas | Variam por setor, estado e município | Nacionalmente uniformes (com exceções regulamentadas) |
Administração | Federal (PIS/COFINS) e estadual/municipal (ICMS/ISS) | Federal (CBS) e Comitê Gestor (IBS) |
Destino da arrecadação | Origem da produção/prestação | Consumo final (destino) |
Transparência | Impostos embutidos | Imposto destacado na nota fiscal |
Essa mudança representa a maior reforma tributária da história brasileira e exige visão estratégica, não apenas ajustes técnicos.
Conclusão
IBS e CBS transformarão a forma como empresas brasileiras gerenciam tributos, formam preços e tomam decisões estratégicas. A transição começa em 2026, mas a preparação precisa começar agora. Empresas que mapearem créditos, formalizarem fornecedores, atualizarem sistemas, treinarem equipes e revisarem contratos chegarão ao novo regime com segurança e vantagem competitiva.
As que esperarem ou subestimarem o impacto enfrentarão riscos fiscais, perda de margem, problemas de fluxo de caixa e desvantagem frente a concorrentes mais preparados. A Reforma Tributária é uma oportunidade de modernizar a gestão e transformar tributos em alavanca estratégica, mas só para quem agir com antecedência e método.
Comments
